Conselho Consultivo do IPHAN se reúne para analisar o Registro do Ofício e Modos de Fazer as Bonecas Karajá como Patrimônio Cultural do Brasil
Durante os dias 25 e 26 de Janeiro de 2012, na Sala de Reuniões da Presidência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Brasília/DF, o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural se reunirá para analisar, entre outros itens da pauta, o requerimento de Registro do Ofício e Modos de Fazer as Bonecas Karajá - bem cultural referenciado às práticas e saberes das mulheres dessa etnia indígena - como Patrimônio Cultural do Brasil.
O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural é um órgão colegiado do IPHAN composto por 18 membros da sociedade civil que atuam em áreas afins ao Instituto, como antropólogos, museólogos, arquitetos, urbanistas e historiadores, e ainda por representantes de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Ministério da Educação, Ministério das Cidades e Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM). Sua responsabilidade é examinar, apreciar e decidir sobre questões relacionadas ao tombamento, ao registro de bens culturais de natureza imaterial e à autorização de saída temporária do país de patrimônio cultural protegido, além de deliberar sobre outras questões relevantes do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
No dia da decisão, além dos membros do Conselho Consultivo, estarão presentes representantes da etnia indígena Karajá, os Superintendentes do Iphan no Estado de Goiás, Salma Saddi, e no Estado de Tocantins, Erialdo Augusto Pereira, além de representantes de outras instituições públicas que deram apoio ao projeto, como a Universidade Federal de Goiás, por meio de pesquisadores do Museu Antropológico (MA/UFG), e a Fundação Cultural do Tocantins, cuja coordenadora dos povos indígenas é da etnia Karajá, Narubia Karajá.
A etnia Karajá ocupa uma vasta região ao longo dos rios Araguaia e Javaé e detém áreas nos territórios dos Estados de Goiás (GO), Mato Grosso (MT), Tocantins (TO) e Pará (PA). Dados demográficos atuais registram a existência de 21 aldeias Karajá com uma população estimada em 2.927 pessoas.
As diferentes manifestações culturais desse povo constituem um importante suporte à memória e à identidade não só da nação indígena, como também referenciam o contato com os não-índios. O grafismo, o artesanato e a arte plumária karajá são algumas referências culturais que transcendem o espaço das aldeias e apresentam-se como identificação do território e da cultura regional.
Dentre as inúmeras expressões culturais materiais da etnia Karajá, as Bonecas, além de obra artística primorosa originada das mãos leves das ceramistas, constituem uma referência significativa do grupo. Confeccionadas em cerâmica, pintadas com uma grande diversidade de grafismos e representando tanto as formas humanas como as da fauna regional, são artefatos que singularizam o povo Karajá diante dos demais grupos indígenas brasileiros e sul-americanos. O pedido de Registro do Ofício e Modos de Fazer as Bonecas Karajá foi solicitado pelos Karajá, através de seus líderes, por meio de abaixo-assinados, acompanhado de cartas de apoio de várias instituições.
Enquanto brincam com as Bonecas ou observam a sua feitura, as meninas Karajá recebem importantes ensinamentos sobre a sua cultura e aprendem também as técnicas e saberes associados à sua confecção e usos. Por representarem cenas do cotidiano e dos ciclos rituais, elas portam e articulam sistemas de significação da cultura Karajá e, dessa forma, são também lócus de produção e comunicação dos seus valores, além de importantes instrumentos de socialização das crianças que, brincando, se vêem nesses objetos e aprendem a ser Karajá.
De acordo com as informações que integram o processo de Registro, as Bonecas Karajá, denominadas na língua nativa ritxoko (na fala feminina) e/ ou ritxòò (na fala masculina), condensam e expressam importantes aspectos da identidade do grupo, além de simbolizar diversos planos de sua sóciocosmologia. As ritxoko são consideradas representações culturais
que comportam significados sociais profundos, por meio dos quais se reproduz o ordenamento sociocultural e familiar dos Karajá.
As Bonecas Karajá integram o acervo de vários museus no país, são procuradas como objetos de decoração e comercializadas junto a turistas e lojas de artesanato locais, regionais e nacionais, convertendo-se em fontes importantes de sobrevivência econômica deste grupo indígena. Entretanto, devem ser compreendidas além da sua expressão puramente material, visto que, desde a sua confecção, elas desempenham um papel importante na reprodução cultural do povo Karajá.
Pequeno histórico
O projeto "Bonecas Karajá: Arte, Memória e Identidade Indígena no Araguaia", iniciado em 2009, vem sendo supervisionado pelo Departamento de Patrimônio Imaterial do IPHAN e coordenado pela Superintendência do IPHAN em Goiás, que privilegiou o estudo dos aspectos imateriais das Bonecas Karajá com o intuito de apresentar subsídios para propor o seu Registro como Patrimônio Cultural Brasileiro, junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
As atividades de pesquisa do projeto desenvolvidas para identificar e documentar o ofício, os modos de fazer e as formas de expressão que envolvem a produção das Bonecas Karajá foram conduzidas por uma equipe do Museu Antropológico da Universidade Federal de Goiás (MA/UFG), composta por pesquisadores especializados na temática Karajá. A pesquisa foi realizada com a comunidade das aleias karajás Buridina Mahãdu e Bdé-Buré, em Aruanã (GO), e da aldeia de Santa Isabel do Morro, ou Hawalò Mahãdu, na Ilha do Bananal (TO).
O pedido de Registro do Ofício e Modos de Fazer as Bonecas Karajá foi apresentado pelas lideranças indígenas das aldeias citadas, contando ainda com a anuência das respectivas comunidades e a da organização Karajá denominada Iny Mahadu Coordenação.
Em quase dois anos de pesquisa, foram identificadas as matérias primas, técnicas e etapas de confecção, além dos mitos e histórias narradas pelos Karajá que expressam a rica relação entre seu povo e o rio, a fauna e a flora local, as relações sociais e familiares e a organização social. Toda essa riqueza e complexidade cultural podem ser identificadas nas cenas esculpidas em barro e ornadas com precisos traços em preto e vermelho das Bonecas.
A compreensão do Ofício e Modos de Fazer as Bonecas Karajá como patrimônio cultural imaterial contribuirá para estimular a sua produção entre as mulheres Karajá, possibilitando o crescimento das condições de autonomia das ceramistas frente às demandas
externas e, ainda, fortalecerá os mecanismos de reafirmação da identidade Karajá. Além disso, sua inclusão na relação dos bens registrados como Patrimônio Cultural do Brasil, caso venha a ocorrer, ampliará a visibilidade do universo diversificado da cultura brasileira.
Fonte: Superintendência do Iphan em Goiás
24/01/2012